segunda-feira, dezembro 20, 2010

Poema de Natal




Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos -
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos -
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai -
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte -
De repente nunca mais esperaremos ...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.



Vinicius de Moraes



Neste Natal , feito de muitas ausências, lembro aqueles que se tornam presentes nesta Encosta do Mar.
Para vós, amigos, os meus votos de Boas Festas , na esperança do milagre, na participação da poesia ... imensamente!

Feliz Natal
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sábado, dezembro 11, 2010

Sede

Foto de Luís Miguel Afonso (1000imagens)



Simples, tão simples como a água que outrora
bebeu,
junto à insólita fonte.
E se era doce, esqueceu.
Era outra água, com o tempo incalculável,
por dentro,
com uvas brutais,
muito perto dos lábios.
Não era amor o que diziam, atrás dos quintais.



José Agostinho Baptista
(in Filho Pródigo)

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sábado, dezembro 04, 2010

Sentir a casa

Foto de Sandy Powers



Sentir a casa, a luz mais densa. Viver agora este contorno
mais do que o de plantas espesso. Temer o espaço,
então, o rectilíneo; ( a memória diz: o útero, o gineceu da flor).
É o solstício no corpo, frigidíssimo som entre folhas,
a memória acorda: nesta hora (visual),
ó porta extinguirmo-nos, rememorar.


Fiama Hasse Pais Brandão
(in Obra Breve)




Na hora de fechar a porta, quando só restam as memórias ...