sábado, abril 23, 2011

Enquanto espero incenso as flores

Foto de Marl1

Enquanto espero incenso as flores
Rodeadas de espinhos negros e púrpura,
Donde se erguem cálices de esporos pigmentados
E se dobram os fetos com folhas de veludo,
E mechas de flocos redondos e verde-água
E no meio sinos suaves e brancos;
A sua boca húmida expira um perfume
Como um fruto doce do pomar do céu.


M. S. Lourenço
(in O Caminho dos Pisões)


Enquanto espero, aqui vos deixo os meus votos de uma Páscoa doce e feliz.

sábado, abril 09, 2011

A árvore do silêncio

Foto de Ingo Dumreicher



Se a nossa voz crescesse, onde era a árvore?
Em que pontas, a corola do silêncio?
Coração já cansado, és a raiz;
Uma ave te passe a outro país.

Coisas da terra são palavra:
Semeia o que calou.
Não faz sentido quem lavra
Se não colhe o que amou.

Assim, sílaba e folha, porque não
Num só ramo levá-las
Com a graça e o redondo de uma mão?

( Tu não te calas? Tu não te calas?!)



Vitorino Nemésio
(in Canto de Véspera)

sábado, abril 02, 2011

O poema ensina a cair

Foto de Ursula I Abresch

O poema ensina a cair
sobre os vários solos
desde perder o chão repentino sob os pés
como se perde os sentidos numa
queda de amor, ao encontro
do cabo onde a terra abate e
a fecunda ausência excede

até à queda vinda
da lenta volúpia de cair,
quando a face atinge o solo
numa curva delgada subtil
uma vénia a ninguém de especial
ou especialmente a nós uma homenagem
póstuma.


Luiza Neto Jorge
(in Poesia)


.