Amor
Pintura de Ferdinand Hodler
Escolhemos um incómodo estatuto,
meu amor: um pássaro incorrecto
(para poder voar) morrermos nele.
Mas gerámos alguns filhos eficazes,
ágeis, duradouros. Contemplando-os,
decorrem-nos tão céleres os dias,
nunca exactamente iguais,
nunca diferentes. É que
existe aquela máxima antiga
solidariamente jurada desde o início
de nossos compromissos:
Sê breve nas horas interiores,
mas por fora sê extenso, derramável
qual um rio. O fundamento do amor.
*
O amor visita o corpo,
o necessita. Lícito divaga
por sombrios lugares,
súbito rumorosos e a arder.
Romã, mentrastos - tantos cheiros
e sabores na docente,
digna espiral.
Tudo aberto em luz na câmara escura:
só porque dois mendigos alcançaram
uma migalha, seu
copo de vinho.
Amando. Ah, que intensos mil-
agres doces nos vêm do corpo.
Que incandescente aptidão.
*
Ora, não digam que não
basta o amor
para resgatar o tempo exausto.
Este acto minucioso,
esta sociedade
por que nos ficamos longamente
gratos e escorrendo.
Nem digam que o amor
é arbitrário:
ele elege e fere
doméstico
quem morre de ferir. Que sorte
(digam antes) esta esgrima, este estar
em tantas posições de gritar.
.............
A. M. Pires Cabral
(in Artes Marginais )
7 Comments:
as palavras da encosta,
uma janela de ar fresco e também de aprendizagem.
obrigada,
isabel :)
Que poema tão íntimo, profundo, fundamental.
Saliento
"Sê breve nas horas interiores,
mas por fora sê extenso, derramável
qual um rio. O fundamento do amor."
As tuas escolhas são perfeitas.
Beijo.
Querida Ana
Tive saudades de ver o teu blog e cá estou...
Beijo
Daniel
Excelende este derrame
do ventre até à foz
*
Óptimas escolhas,
Pintura e Palavras,
parabens,
uma encosta de conchinhas,
ficam,
*
"...
Ora, não digam que não
basta o amor
para resgatar o tempo exausto.
..."
... e o grito fica.
Bjo
o Amor...ai o Amor
nao conhecia...gostei mto
brisas doces*
Enviar um comentário
<< Home