Gaivotas - I
Foto de Major Morais e Castro aqui
Voltei ontem à casa branca. Há tanto tempo que lá vou que já se me tornou familiar. Entro com à vontade, como se fosse em minha casa. Já me conhecem e não estranham que tenha voltado. Não gosto de lá ir, mas sei que não há alternativa.
Subo lentamente as escadas. O cheiro envolvente é o mesmo de sempre. Há pessoas sentadas em bancos encostados às paredes. Têm no rosto a expressão do desalento.
Entro na sala com as camas alinhadas. Esboço um leve sorriso e um cumprimento, mas a resposta são uns vagos monossílabos. Cada um está imerso nos seus pensamentos. Não faço ideia se me vêem e fingem não ver, ou se, nem sequer, me vêem. Eu própria, ao fim de algumas vezes, deixei de ter vontade de falar com quem me rodeia.
O que mais me choca é esta incapacidade de falar do sofrimento. Como se fosse vergonha mostrar a dor. Como se a chaga maior fosse a tristeza não partilhada.
Por vezes, julgo reconhecer quem está nas camas ao lado da minha. Cada vez mais magros, cada vez mais pálidos. Um dia deixarão de vir. Suponho que sei qual a razão. Sei que eu, mais cedo ou mais tarde, também deixarei de vir. Por agora, não quero pensar nisso. Sei que o mundo continuará e que os pássaros não deixarão de cantar.
Leio o livro que levo, sonho que tenho asas e que voo pela janela. Lá fora, o céu é azul e as árvores estão floridas.
Quando saio, passadas umas horas, regresso ao bulício da cidade e a casa branca vai-se esfumando, até não ser mais que uma memória que afasto, como se fosse um cabelo caído para os olhos. Volto a ver os carros e as pessoas apressadas. Não percebo bem porque precisam correr. A eterna falta de tempo...
Agora, que estou cá fora e, até ter de voltar, vou continuar a ver a beleza dos dias. Quero voltar a ver o mar, a maravilhar-me com o voo livre das gaivotas, a sorrir para quem se cruza comigo, a acreditar que o sonho é, ainda, possível.
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Subo lentamente as escadas. O cheiro envolvente é o mesmo de sempre. Há pessoas sentadas em bancos encostados às paredes. Têm no rosto a expressão do desalento.
Entro na sala com as camas alinhadas. Esboço um leve sorriso e um cumprimento, mas a resposta são uns vagos monossílabos. Cada um está imerso nos seus pensamentos. Não faço ideia se me vêem e fingem não ver, ou se, nem sequer, me vêem. Eu própria, ao fim de algumas vezes, deixei de ter vontade de falar com quem me rodeia.
O que mais me choca é esta incapacidade de falar do sofrimento. Como se fosse vergonha mostrar a dor. Como se a chaga maior fosse a tristeza não partilhada.
Por vezes, julgo reconhecer quem está nas camas ao lado da minha. Cada vez mais magros, cada vez mais pálidos. Um dia deixarão de vir. Suponho que sei qual a razão. Sei que eu, mais cedo ou mais tarde, também deixarei de vir. Por agora, não quero pensar nisso. Sei que o mundo continuará e que os pássaros não deixarão de cantar.
Leio o livro que levo, sonho que tenho asas e que voo pela janela. Lá fora, o céu é azul e as árvores estão floridas.
Quando saio, passadas umas horas, regresso ao bulício da cidade e a casa branca vai-se esfumando, até não ser mais que uma memória que afasto, como se fosse um cabelo caído para os olhos. Volto a ver os carros e as pessoas apressadas. Não percebo bem porque precisam correr. A eterna falta de tempo...
Agora, que estou cá fora e, até ter de voltar, vou continuar a ver a beleza dos dias. Quero voltar a ver o mar, a maravilhar-me com o voo livre das gaivotas, a sorrir para quem se cruza comigo, a acreditar que o sonho é, ainda, possível.
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