quarta-feira, maio 20, 2009

Dispersão

Foto de Pierre Kessler aqui


Perdi-me dentro de mim
Porque eu era labirinto,
E hoje , quando me sinto,
É com saudades de mim.

Passei pela minha vida
Um astro doido a sonhar.
Na ânsia de ultrapassar,
Nem dei pela minha vida...

Para mim é sempre ontem,
Não tenho amanhã nem hoje:
O tempo que aos outros foge
Cai sobre mim feito ontem.

(...)

Desceu-me n'alma o crepúsculo;
Eu fui alguém que passou.
Serei, mas já não me sou;
Não vivo, durmo o crepúsculo.

Álcool dum sono outonal
Me penetrou vagamente
A difundir-me dormente
Em uma bruma outonal.

Perdi a morte e a vida,
E, louco, não enlouqueço...
A hora foge vivida
Eu sigo-a, mas permaneço...

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...

Castelos desmantelados,
Leões alados sem juba...

... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...




Mário de Sá- Carneiro

Nasceu em Lisboa, em 19 de Maio de 1890

.

14 Comments:

Blogger hfm said...

Por tudo isto ele era "qualquer coisa de intermédio". Gosto tanto dele e penso que ainda não lhe demos o seu verdadeiro valor.

2:20 da tarde  
Blogger Porcelain said...

Se mergulharmos dentro de nós... é fácil perder-nos... somos labirínticos por definição... mas se mergulharmos dentro de nós, mesmo que nos percamos, encontrar-nos-emos um dia, muito mais ricos do que éramos antes... perdemo-nos verdadeiramente de nós, sim, quando deixamos que a vida nos passe ao lado, quando não temos espaço na nossa vida para parrar e apreciar a paisagem... :)

Beijinhos!

7:22 da tarde  
Blogger Eu said...

É incrível como muitas vezes nos vemos nas entrelinhas do poema de alguém...
Maravilhoso o poema e tudo o que dele exala...

Um abraço carinhoso

7:33 da tarde  
Blogger ~pi said...

belo belo

entre-si-por-dentro

menino-gordo-mal-amado,

] como o entendo!






~

8:53 da tarde  
Blogger Maria said...

Este Homem deveria ser mais divulgado por aqui, na blogo...
Obrigada por o teres feito, Ana.

Beijinho

3:38 da manhã  
Blogger Mare Liberum said...

Bem-hajas por me teres trazido Mário de Sá-Carneiro. Deixou-nos muito cedo e tanto tinha para nos dar.
Também me sinto um pouco perdida dentro de mim.

Beijinhos mil encosta linda

6:45 da manhã  
Blogger © Maria Manuel said...

belíssimo poema este! e tão próximo de Fernando Pessoa...

9:19 da manhã  
Blogger M.A. said...

Concordo em absoluto com a Helena
(hfm).

beijo,

mariah

5:30 da tarde  
Blogger AnaMar (pseudónimo) said...

Um dos meus poetas preferidos. Obrigada por o lembrares.
Bj

5:55 da tarde  
Blogger Branca said...

Maravilhoso este poema, onde é tão fácil revermo-nos, em determinados momentos da vida.
Beijinho
Branca

1:42 da manhã  
Blogger Lídia Borges said...

Excelente escolha. Gosto muito de Mário de Sá Carneiro.
Ser labirinto, procurar sempre o que nos falta dentro de nós...

2:39 da tarde  
Blogger Lídia Borges said...

Este comentário foi removido pelo autor.

2:39 da tarde  
Blogger . intemporal . said...

bel.íssima a selecção.

neste perder onde me encontro.

sempre neste tão sempre.

aqui.

um beijo enorme ana.

12:26 da manhã  
Blogger lupuscanissignatus said...

(d)as entranhas

de um

cometa

7:07 da tarde  

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