Na cabeça de um homem há muitas línguas a falar diferente
Falam com bocados umas das outras e estão unidas sem saber
Quando um homem pensa sozinho consigo mesmo
E quer tirar da cabeça uma produção útil para todos.
Por exemplo: Penso Rio. É matsi, é water, é água,
É quilos de litros a andar depressa
É uma música da água, é um desenho da água na cabeça.
Posso falar Rio; posso medir Rio; posso desenhar Rio.
Posso tirar o Rio da cama e pôr o Rio acordado num papel
Que é um retrato parecido deste Rio mesmo este.
Isto que faz na cabeça de um homem tirar retrato são línguas
O Rio, a Árvore, o Animal, a Rocha, a Terra, o Sol, o Vento
São as caras da Natureza que as minhas línguas estudam.
A escola Primária Colonial está mal.
A língua das palavras não chega para tudo
É preciso aprender uma língua dos números
É preciso aprender a língua dos desenhos
As três línguas juntas é que são a língua verdadeira do Homem
E depois o Homem já fala à Natureza bem
E pode aprender dela tudo o que há-de ensinar.
Sigo a pista do cabrito: pegadas e capim partido. É desenho isso.
O excremento está fresco ao Sol. Passou pouco. É cálculo aritmético.
Está ali. Não é cabrito. É cabrita. Falei com palavras.
Conheço que não sei pensar nada só numa língua.
Imagem e poema de António Quadros