domingo, fevereiro 26, 2006

Amor à vista


Foto de Manau aqui


Entras como um punhal
até à minha vida.
Rasgas de estrelas e de sal
a carne da ferida.

Instala-te nas minas.
Dinamita e devora.
Porque quem assassinas
é um monstro de lágrimas que adora.

Dá-me um beijo ou a morte.
Anda. Avança.
Deixa lá a esperança
para quem a suporte.

Mas o mar e os montes...
isso , sim.
Não te amedrontes.
Atira-os sobre mim.

Atira-os de espada.
Porque ficas vencida
ou desta minha vida
não fica nada.

Mar e montes teus beijos, meu amor,
sobre os meus férreos dentes.
Mar e montes esperados com terror
de que te ausentes.

Mar e montes teus beijos, meu amor!...


Fernando Echevarría

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Príncipe


Foto retirada de Dias de Chuva



Príncipe:
Era de noite quando eu bati à tua porta
e na escuridão da tua casa tu vieste abrir
e não me conheceste.
Era de noite
são mil e umas
as noites em que bato à tua porta
e tu vens abrir
e não me reconheces
porque eu jamais bato à tua porta.
Contudo
quando eu bati à tua porta
e tu vieste abrir
os teus olhos de repente
viram-me
pela primeira vez
como sempre de cada vez é a primeira
a derradeira
instância do momento de eu surgir
e tu veres-me.
Era de noite quando eu bati à tua porta
e tu vieste abrir
e viste-me
como um náufrago sussurrando qualquer coisa
que ninguém compreendeu.
Mas era de noite
e por isso
tu soubeste que era eu
e vieste abrir-te
na escuridão da tua casa.
Ah era de noite
e de súbito
tudo era apenas lábios pálpebras
intumescências cobrindo o corpo de flutuantes
volteios de palpitações trémulas adejando
pelo rosto beijava os teus olhos por dentro.
Beijava os teus olhos pensados
beijava-te pensando
e estendia a mão
sobre o meu pensamento corria para ti
minha praia jamais alcançada
impossibilidade desejada
de apenas poder pensar-te.

São mil e umas
as noites em que não bato à tua porta
e vens abrir-me.


Ana Hatherly

sábado, fevereiro 18, 2006

Gotas de Luz





O poema
Rasga o peito
Abre o seu caminho
Vence o desespero
Emudecido
A que estava condenado
E parte obstinado
Através do tempo
Interrompido

(...)


Este excerto de poema foi deixado como comentário ao post anterior, pelo meu amigo Frog do blog "Outra voz", autor do livro "Gotas de Luz", recentemente publicado.
A tarde de sábado, sombria e chuvosa, iluminou-se de poesia.
Obrigada, Frog .

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

O poema nasce


The face of peace ( Picasso)



O poema nasce
dentro das tuas mãos
sempre que repousa
nelas o teu rosto.

Não é uma canção:
são os lábios apenas
quando despertaram
antes da palavra.

Arquitectura última
que depois se eleva,
porque tu a criaste
para sempre livre.

Talvez uma ave
seja a sua forma
ao passar o voo
que continua o poema.


Fernando Guimarães

domingo, fevereiro 12, 2006

Z


Le Jardin à Les Lauves ( Cézanne)



As formas, as sombras, a luz que descobre a noite
e um pequeno pássaro

e depois longo tempo eu te perdi de vista
meus braços são dois espaços enormes
os meus olhos são duas garrafas de vento

e depois eu te conheço de novo numa rua isolada
minhas pernas são duas árvores floridas
os meus dedos uma plantação de sargaços

a tua figura era ao que me lembro
da cor do jardim.


António Maria Lisboa

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Reflexos





Povoados de nuvens sombrias ou coloridos de raios de sol, passaram 365 dias. Sempre presente esteve o mar, a imensidão do mar. Os reflexos ficaram, nas palavras que escolhi.
Agradeço aos que me acompanharam ao longo deste ano.
A Encosta do Mar irá permanecer. Sintam-se todos benvindos.


A ti, A., que hoje voas em perfeita liberdade, que as asas que conquistaste te levem a horizontes onde o sol nunca se põe.
.

terça-feira, fevereiro 07, 2006

Ninfa


Birch forest ( Gustav Klimt)



No bosque. Ninguém a viu.
Flor aberta, flor fechada.
Por que vibraram os deuses
sua beleza ignorada?

Por que passou pelo bosque
tão amável perfeição,
se pelo bosque passava
apenas a solidão?


Alberto de Lacerda

sábado, fevereiro 04, 2006

Finis terrae






Fim da terra
onde o céu abraça o mar.

Nuvem
espuma
gaivota
de tudo foi feito o dia
na secreta nostalgia
de uma saudade que volta.
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